quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Botelhos perde mais um imóvel da década de 20



Pedro Cunha

No fim do mês de setembro, a população de Botelhos se surpreendeu com a demolição de mais um de seus antigos imóveis, construídos na década de 20 e integrante do acervo arquitetônico da cidade e inventariado pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural do Município.
O imóvel, localizado na Avenida Major Antonio Alberto Fernandes, hoje, popularmente conhecido como o prédio da Taberna 54, foi construído pela família do Sr. Pedro di Perna.
Segundo o livro “Botelhos – Patrimônio Histórico de Cultural”, produzido pelo Conselho Municipal e Prefeitura, Pedro di Perna nasceu na Itália, em 1899, e chegou a Botelhos aos nove meses de idade. Estudou comércio e contabilidade e, aos 23 anos, começou a comercializar café, adquirindo e exportando boa parte da produção da região do sul de Minas. Em 02 de agosto de 1.921, o Sr. Pedro di Perna, seu cunhado Vicente Tepedino e mais três sócios, fundaram a primeira casa bancária de Botelhos, localizada no imóvel demolido nos últimos dias.
Em Poços de Caldas, na década, de 30, a família Moreira Salles também vinha atuando no setor bancário, transformando a seção bancária da Casa Moreira Salles, na Casa Bancária Moreira Salles, que iria se juntar mais tarde, na década de 40, com a Casa Bancária de Botelhos e com o Banco Machadense, transformando-se no Banco Moreira Salles, marcando o início da trajetória do Unibanco, um dos maiores privados do País. Conforme relato histórico do Instituto Moreira Salles: “Em 1940, os proprietários da Casa Bancária Moreira Salles e a Casa Bancaria de Botelhos firmaram-se a convicção de que a só cresceriam se juntassem esforços com outros estabelecimentos similares da região. A idéia de juntar a Casa Bancária Moreira Salles, a Casa Bancária de Botelhos, - no qual Pedro di Perna, que teria um papel executivo chave no Banco Moreira Salles- e o Banco Machadense,de propriedade de grandes fazendeiros com interesse secundário no negócio bancário, num estabelecimento único parecia reunir toda a conveniência. Assim, No dia 15 de julho de 1940, o Banco Moreira Salles recebeu sua carta patente. Sua sede seria em Poços de Caldas”.
Após a formação do Banco Moreira Salles, o prédio da Avenida Major Antonio Alberto Fernandes foi sede da Delegacia de Polícia, juntamente com a Radio São José, de propriedade dos srs. Altamiro Valim e Sérgio de Paula Dias, o Xará, cuja locução também era feita pelo Sr. Noel Sandy, que alegrava a comunidade botelhense com o programa “Rancho da Amizade”, que tinha como prefixo musical a música “Pic nic na fazenda”, do conjunto gaúcho “Os Montanari”, que ia ao ar das 13h às 15h.
“A Radio São José, que teve que ser fechada, pois não era legalizada, mais naquele prédio, iniciaram na carreira os amigos Benedito Fonseca e Flávio Anunciação” lembra Noel Sandy.
Na década de 50, o imóvel foi comprado, com recursos próprios, pelo prefeito municipal Sr. Ernesto Romão de Siqueira, para abrigar a Prefeitura Municipal, que não possuía local para funcionar.
Neste período, o prédio foi utilizado como sede da Prefeitura, até a construção da sua sede própria, inaugurada em 1976, localizada na Praça São Benedito, que hoje passa por reforma depois que uma forte chuva de granizo danificou o local.
Nos anos posteriores, tendo como proprietária a família do Sr. João Batista de Abreu, a parte térrea do prédio da Avenida Major Alberto foi ocupado pelo escritório das Centrais Elétricas de Minas Gerais (Cemig), onde permaneceu até a década de 1990.
Em sua parte superior, funcionou o Bar Casarão, ponto de encontro da juventude e dos apreciadores da boa música ao vivo. Após, o prédio foi alugado como ponto comercial da Haus Vídeo Locadora, de propriedade de Maria Eduarda Tavares Junqueira, a Dadati. “Inauguramos a locadora no dia 15 de setembro de 1990, onde permanecemos até 1998. Foi o primeiro ponto comercial a utilizar o “néon”, febre na época, como letreiro de propaganda”, lembra Dadati.
Em 1998, a parte superior do prédio foi sede do jornal Folha Agrosul, dirigido ao setor agropecuário, de propriedade de Daniela Abreu e Vânia Marques. A Folha Agrosul funcionou no prédio até 2004, e depois foi transferida para a Praça Gabriel Botelho, nº 130, no centro da cidade.
No piso inferior, em 1998, o imóvel foi transformado em uma Taberna, de nº 54, local de encontro da juventude, com decorações estilizadas, típicas de um pub italiano. A taberna 54, de propriedade da Sra. Mariângela Ayres Abreu, oferecia aos clientes diversas opções de bebidas, porções, além de musica ao vivo e promovia o encontro de toda Botelhos nos principais eventos como o encontro de jipeiros, cavalhada, as Copas do Mundo de 98, 2002 e 2006, o carnaval, local que recebia grande concentração de pessoas que prestigiavam as festas em Botelhos. “Tenho boas recordações da Taberna, pois além de muita amizade e respeito, o local também trazia momentos de nostalgias e recordações, pois quando o prédio foi sede da Prefeitura, lembro de meu avô, João Batista de Abreu, então Prefeito da cidade, que tinha um escritório onde era a cozinha da Taberna 54 e, em momentos de inspiração, ou pintava meus quadros sempre acompanhada de lembranças de meu avô”, conta Mariângela.
A taberna 54 funcionou no prédio da Avenida Major Antonio Alberto Fernandes até 2009, o local chegou a receber em seus eventos mais de mil pessoas e um só dia. “Foi palco de muitas gerações, de famílias, de casais de namorados que se conheceram, namoraram e casaram” recorda Mariângela.

Descrição
No relatório apresentado pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural do Município, em 2005, e determinante para a incorporação como parte integrante dos imóveis inventariados de Botelhos, ou seja, imóvel que faz parte da história da cidade, o prédio trazia algumas peculiaridades em sua parte arquitetônica, como descrita no relatório: “O acesso ao primeiro pavimento se dá direito à rua e o no segundo pavimento por uma escada em “U” que chega ao alpendre... O telhado possui cumeeira perpendicular à rua, várias águas, apresentando estrutura em madeira, coberto com telhas francesas....Os elementos decorativos encontrados na fachada frontal foram frontão decorado com brasão, frisos, relevos geométricos, florais, “colunas” nas laterais das janelas, sacada guarda corpo em ferro e portas de acesso ao primeiro pavimento almofadadas...”

O Conselho
De acordo com Luiz Carlos de Souza, o Chiquinho, presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural do Município, o pedido de demolição do prédio foi protolocado na Prefeitura, pelo atual proprietário do imóvel no final de agosto de 2010. Segundo ele, por se tratar de prédio privado, e tendo o conselho uma política de preservação apenas dos atuais prédios públicos, e devido à falta de recursos para atuar no setor privado, o Conselho, juntamente com a Prefeitura, deliberaram positivamente pela sua demolição. Porém, segundo o presidente, foi solicitada uma reunião com o proprietário, no sentido de resguardar a memória do patrimônio através de fotos, relatórios ou vídeo, que, segundo o proprietário, a citada reunião e o pedido não foram oficializados. Sendo assim, em posse de toda documentação legal e autorização confirmada, o proprietário do imóvel iniciou a demolição do prédio no final do mês de setembro.